A PRÁTICA DE ARTES MARCIAIS POR IDOSOS

A PRÁTICA DE ARTES MARCIAIS POR IDOSOS
As artes marciais não são exclusividade dos jovens, podendo beneficiar muito as pessoas mais velhas. Pesquisa holandesa indica que a prática pode prevenir fraturas causadas por quedas, principalmente em portadores de osteoporose
Helio P. Leite
04.05.2010
Quem pensa que as lutas são esportes para jovens pode ter uma surpresa na aula do mestre Deo, professor de jiu jitsu. Esbanjando vitalidade e saúde, Deoclécio Paulo, 76 anos, é a prova viva de que esse tipo de atividade pode combinar com a terceira idade. O professor, que há mais de 65 anos se dedica à arte marcial, corrobora com a conclusão de especialistas de que, tomados os devidos cuidados, as lutas podem ser uma boa atividade para os mais velhos manterem a vitalidade e até mesmo prevenir doenças.

A história de mestre Deo com o esporte começou ainda na infância. E ele garante que não tem prazo para acabar. “Eu comecei para não apanhar dos meninos na rua. Quando entrei para o exército, continuei lutando. E, agora que me aposentei, essa é a minha principal atividade”, conta. Para ele, mais do que um exercício para o corpo, o esporte também trabalha a mente. “Muitos consideram algo violento, do que eu discordo. É como um jogo de xadrez, no qual você tem de antecipar os movimentos do oponente e tentar agir antes dele”, completa.

Uma possível aposentadoria está fora de cogitação. “Eu não tenho pressa para parar. Se isso acontecer, eu vou fazer o quê? Ficar em casa?”, questiona o lutador, que, depois de alcançar a mais alta graduação no esporte, dá aulas para pessoas de todas as idades. “Além do mais, foi aqui que eu fiz meus melhores amigos. Tenho meus alunos como filhos, então não pretendo me afastar disso tão cedo”, completa Deo, que atribui ao esporte a sua saúde impecável.

Para os alunos, o que no início pode parecer estranho, acaba se tornando um ponto positivo. “O bom de ter um professor mais velho é que ele transmite mais experiência, mais sabedoria”, conta o aluno Laer Carneiro, 25 anos. “Acho que é o jiu jitsu que o mantém ativo. Se ele parasse, acho que ele não se manteria tão saudável. Além disso, ele é como um pai para mim”, completa o colega Bernardo Henrique, 21 anos.

Uma pesquisa da Universidade de Vrije, em Amsterdã, Holanda, aponta que a prática de lutas pode ajudar a prevenir fraturas em idosos que sofrem de osteoporose, doença que, só no Brasil, atinge cerca de 10 milhões de pessoas, a maioria com mais de 65 anos. Brenda Groen, uma das responsáveis pelo estudo, explica que as lutas ajudam a limitar o impacto dos tombos. “Cerca de 90% das fraturas do quadril ocorrem como resultado de uma queda. A partir de pesquisas anteriores, sabe-se que as técnicas de quedas das artes marciais ajudam a reduzir a força de impacto no quadril durante uma queda para os lados”, conta ao Correio a pesquisadora holandesa.

Para ela, os idosos podem utilizar os conhecimentos de artes marciais para reduzir os riscos de fraturas no dia a dia. Ela lembra, no entanto, que os estudos ainda são preliminares, e que a fragilidade da estrutura óssea de quem sofre com a doença exige alguns cuidados especiais. “Por razões de segurança, o impacto sobre os ossos não poderia ser diretamente avaliado usando pessoas com osteoporose. Portanto, nós medimos forças de impacto durante exercícios de queda em adultos jovens e comparamos com a base em informações de estudos anteriores sobre o impacto no fêmur que uma pessoa idosa com osteoporose pode suportar”, explica Brenda. “Nós acreditamos que, utilizando protetores de quadril e evitando cair de frente, as lutas podem ser seguras para quem sofre de osteoporose moderada”, completa.

Equilíbrio e força
Para o personal trainer Gustavo Bergamaschi, que trabalha com alunos idosos, as atividades de luta podem ser boas especialmente para quem já tem o hábito de praticar atividades físicas. “Se a pessoa já pratica outras atividades e tem um corpo preparado, não vejo por que não praticar”, afirma. “As lutas ajudam na manutenção do equilíbrio e no fortalecimento muscular. O único cuidado que eu recomendo é diminuir a intensidade dos treinamentos, para evitar uma luxação ou fratura.”

Ele concorda com a pesquisa holandesa e acredita que o conhecimento dos movimentos de luta pode ser útil para prevenir as fraturas causadas por quedas. “Se a pessoa tem uma vivência maior em lutas, com certeza vai conseguir utilizar esses conhecimentos para evitar que uma queda resulte em algo mais grave”, afirma o professor de educação física.

Para o carateca Gerardo Coelho, 55 anos, a grande vantagem das lutas é que elas acompanham o desenvolvimento de cada um. “Você vai evoluindo de acordo com a sua idade. Em geral, só se chega à faixa preta depois de uma idade mais avançada, já que é preciso muito treino e dedicação”, conta o lutador, que pratica o esporte desde os 14 anos. “Hoje o caratê é tudo para mim. Não consigo imaginar a minha vida longe das lutas”, completa.

Ele também não tem previsão para se afastar do tatame. “Muitos acham que esse tipo de atividade é só para os mais novos, mas eu não concordo. Todo mundo pode praticar e colher os seus benefícios”, afirma Gerardo. “Pelo menos para mim, foi tudo muito natural. Eu fui envelhecendo e a minha técnica foi evoluindo junto”, garante.

E engana-se quem pensa que as lutas só servem para quem começou cedo. O policial federal Ricardo Santos, 46 anos, resolveu retomar no início do ano uma atividade dos tempos de criança. “Quando eu tinha 7 anos entrei nas aulas de jiu jitsu. Agora resolvi voltar e estou vendo que realmente nunca é tarde para começar. É uma terapia. A gente vai para a academia e esquece os problemas. É muito bom”, afirma.